quarta-feira, 31 de março de 2010

Pendências

Danilo esperava Marina an-si-o-sa-men-te, como quem espera a resposta de uma entrevista de emprego promissora – achando que tinha feito o seu melhor, mas ciente de que a decisão final não lhe cabia.

Depois de meses de palpitações e vontades de ser feliz, depois de todos os pedidos de amor correspondido enviados por todos os cupidos possíveis, depois de toda a excitante indecisão de Marina, depois de tudo que Danilo passou para ficar só com e-l-a... Passados todos os depois possíveis, Marina lhe comunicara que estava certa de que queria mesmo era se jogar com ele, ser feliz, sorrir sem parar enquanto o infinito permitisse.

Marina sussurrou isso ao telefone e Danilo mal acreditou. Pediu a todos os deuses do amor que lhe beliscassem para ver se estava, de fato, acordado, vivo, respirando. Estava. Ela pedira um encontro para que selassem, enfim, um pacto de amor e pudessem seguir seus caminhos juntos.

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Mas Marina não chegava nunca. Estava meia hora atrasada. Danilo já sentia novamente a desilusão batendo à porta de sua consciência. Seu coração talvez não suportasse a dor de um novo tombo e, por isso, não sabia o que o trazia ali. Preferiu arriscar, com as esperanças de não se decepcionar.

Quarenta e cinco minutos. Nada.

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Foi quando Danilo viu Marina despontando no horizonte e trazendo consigo marcas da luz solar em seu vestido azul. Tinha os cabelos soltos que sacolejavam pelos ombros, bagunçando a concentração de Danilo. Seus olhos levemente pintados, sorriam de leve, com ar de ofegante. Ela mordia um cantinho da boca, como sempre fazia quando estava pensativa. Suas bochechas rosadas mostravam inquietação. O peito urgia, parecia que o coração queria dizer alguma coisa:

- Desculpe o atraso. Fiquei enrolada no trânsito das ruas, dos faróis... de mim – explicou ela.

O sorriso de Marina dizia tudo. Danilo respirou, enfim.

- Nenhum trânsito importa agora que a mulher mais linda do mundo chegou – suspirou o coração apaixonado de Danilo.

Nada mais ficou pendente.

sábado, 27 de março de 2010

As pessoas comemorando os anos de prisão do casal Nardoni fez brotar algumas lágrimas aqui. Não porque discordo do que se passou, mas porque não há o que comemorar. Fogos de artifício para celebrar o quê? A tristeza segue, minha gente. Não há um porquê consistente para isso. Não mesmo.

É claro que tudo isso fez lembrar do dia que você jogou pela janela do seu nono andar a nossa felicidade já tão machucada pela convivência breve. O cenário é assustadoramente parecido e a dor nunca deixa de me rondar. Tudo já estava bagunçado e você rasgou a teia de proteção e arremessou tudo que vivemos mundo afora. Mas não torço para que você seja condenado. Pelo contrário, espero que você esteja mais feliz, como desejava naquele dia.

Mas continuo não tendo o que comemorar. Não mesmo.

domingo, 21 de março de 2010

"De repente ela percebeu que o amor era o instante em que o coração fica a ponto de explodir".

Lisbeth Salander, em Os Homens que Não Amavam as Mulheres, de Stieg Larsson

sexta-feira, 19 de março de 2010

a arte de ver no escuro

Incrível como o barulho do silêncio dentro da madrugada é confortável. Na pausa do sono para o xixi, tudo se resume a uma escuridão sem propósito, mas necessária – acender a luz pode significar a fuga do sono (e ninguém pode querer isso às 3h). No escuro a parede é tateada e sentimos, de verdade, o verde dos azulejos. No intervalo de poucos minutos, penso em como a casa dorme de um jeito lindo, carinhoso. Tudo de olhos fechados e retinas sonolentas.

Ontem, no recreio do sono, lembrei da casa antiga, onde, freqüentemente, eu errava a porta e entrava no quarto do pai que dormia de conchinha com a mãe. Aconchegava meu corpo no meio deles e me sentia assim: amada de um jeito especial, de um jeito que sentimos quando cabemos em colos impreterivelmente.

Perdi o sono, é claro. E, ao invés de contar carneirinhos, pontuei na clara escuridão do teto as saudade dos azulejos laranjas com detalhes em branco do banheiro de lá. Saudades do quartão grande com três camas, onde eu e as irmãs (medindo menos de um metro) vivíamos juntas. Saudades de achar a cama do pai e da mãe, sempre prontas a atender um pedido irrecusável de carinho. Saudades da simplicidade, compreensão e felicidade genuína.

Saudades de caber em colos. É isso.

quarta-feira, 17 de março de 2010

gerúndios

Impaciência circulando nas veias.
Saudade bombeando melancolia para átrios e ventrículos.
Atenção falhando nas ideias.
Trabalho deixando a desejar no quesito "estar satisfeita".
Dor de estômago cansando o sorriso gentil de sempre.


Foi quando descobri que o gerúndio da vida não vai acabar nunca.
Quero minha mãe.